Lendo a Bíblia, no
livro chamado Números (capítulos 22-24), o quarto livro da primeira parte da
Bíblia, parte conhecida como o Antigo Testamento, deparamo-nos com a intrigante
história do profeta Balaão; e com o estranho milagre de uma jumenta que falou.
Sim, este é um
milagre estranho; porque, na Bíblia, os milagres têm um certo padrão. Em geral,
eles consistem em criar, intensificar ou fazer cessar fenômenos naturais; há
alguns poucos casos em que milagres causaram enfermidades, a grande maioria é
de cura, e também alguns raros casos de ressurreição de mortos. Em geral, os
milagres da Bíblia geram efeitos expectados, seja com temor, ou com esperança;
por mais impossíveis que pareçam, ele têm uma certa racionalidade.
Papagaios, e algumas
outras espécies de aves próximas daqueles, possuem uma impressionante habilidade
de imitar a voz humana, repetindo palavras e expressões idiomáticas. Alguns
cães parecem tentar acompanhar o canto de uma música. Porém, um jumento falar,
e argumentar de forma perspicaz, isso é demais!
O meio mais comum de
Deus se comunicar foi através de profetas, antes de comunicar por Jesus Cristo
(Hebreus 1.1-2). Outras vezes se comunicou através de anjos (Lucas 1.26-27);
ou, simplesmente, por uma "voz vinda do céu" (Mateus 13.17).
No livro de Gênesis,
capítulo 3, lemos sobre o diálogo que a serpente teve com a mulher; porém, em
Apocalipse 12.9, lemos que o “grande dragão (é) a antiga Serpente, que se chama
diabo e Satanás”. Ainda assim, uma jumenta falando, é um relato bastante
curioso, chega parecer lendário.
Por mais espetacular
e estranho que seja, longe mim duvidar que aquela jumenta tenha falado, claro,
somente naquele momento. Afinal, como disse Jesus: "para Deus tudo é
possível", até fazer “entrar um rico no reino de Deus” (Mateus 19.24-26). Certa
vez, para demonstrar sua autoridade divina para perdoar pecados, Jesus curou um
paralítico, que passou a andar imediatamente (Mateus 9.1-8).
Deus é o Criador de
um universo de "ilimitada" variedade, um mundo de impressionantes
surpresas. “Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras
das suas mãos” (Salmos 19.1); porém, o homem se recusa a glorificar a Deus, e
lhe dar graças (Romanos 1.21); e mais, “não há quem entenda, não há quem busque
a Deus” (Romanos 3.11). Então, um milagre pode, ao menos por algum instante,
fazer com que o homem pare e pense em Deus. Além disso, fazer um jumento falar
diante de um líder religioso é algo especialmente sugestivo, instrutivo,
apropriado e marcante.
Quem é Balaão?
Muitos cristãos, hoje, tendem a "santificar" os judeus (israelitas),
e "demonizar" os demais povos. Assim, Balaão é tido, por muitos, somente
como um odioso inimigo dos interesses de Israel, e até indigno de qualquer tipo
de comparação com o povo de Israel, ou com personagens história de Israel.
Entretanto, não
deveríamos ignorar que Balaão é um descendente de Noé, com quem Deus fizera um
Pacto de Salvação, após o Dilúvio. Nos dias de Abraão, não somente os povos
cananitas, descendentes de Cam, filho de Noé, mas igualmente os povos jafetitas
e semitas, também descendentes de Noé, estavam todos corrompidos. E, destes
últimos, os semitas, também descende Abraão, pai da nação de Israel, e
provavelmente o próprio Balaão. Havia muito tempo, as nações, de modo geral, haviam
se afastado da fé, e desprezado a Aliança que Deus fizera com Noé, e suas
gerações.
Portanto, devemos
pensar em Balaão como um líder religioso, um profeta, entre um povo que tinha
uma remota conexão com a fé do patriarca Noé, e com Aliança Salvadora que Deus
fizera com Noé, e sua descendência.
Como foram vários
corrompidos reis, profetas e sacerdotes na história de Israel, como pastores
corrompidos, em igrejas deformadas no âmbito da cristandade, assim era Balaão
no seu tempo; ele era um líder religioso projetado, e até temido, muito além de
sua base, ao norte da Mesopotâmia, no mundo de então. Balaão era respeitado
inclusive na distante terra de Canaã, lugar de uma multifacetada religião
apóstata, nascida onde e quando morrera a fé legada por Noé aos seus
descendentes.
No período entre Abraão
e Moisés, outros dois líderes se destacaram, e de forma mais positiva que Balaão:
o misterioso Melquisedeque que Abraão conheceu, também chamado "sacerdote
do Deus Altíssimo, e que é um dos mais expressivos tipo de Jesus Cristo; e Jetro,
um sacerdote de Midiã, sogro de Moises, mostrou-se um prudente conselheiro.
Balaão, entretanto,
era possivelmente também um sacerdote, inegavelmente era um profeta, um influente
líder religioso, típico de uma geração em decadência espiritual, moral e
cultural.
Quando a nação de
Israel, não por seus méritos, mas conforme o eterno propósito de Deus e sua
infinita misericórdia, após sua libertação do cativeiro no Egito, e ao final de
quarenta nos de peregrinação no deserto, começa a conquista da terra de Canaã,
aparece Balaão.
Esse homem não era
completamente ignorante sobre Deus. Ele mesmo considerava-se um homem com
"olhos abertos", “que ouve os ditos de Deus” e que tinha “a visão do
Todo-Poderoso” (Números 24.3-4). Ele sabia que como profeta deveria comunicar
fielmente a Palavra de Deus (Números 22.18). Entretanto, Balaão era ao mesmo
tempo um homem moldado para (e pela) busca da fama e poder. Ele conhecia e
desejava a fama e o poder, mais do que servir a Deus. Como sua fama e poder
foram obtidos por meio da religião, ele enganava, não somente aos outros, mas
também a si mesmo com um falso zelo de profeta – uma falsa declaração da
responsalidade de comunicar a verdade, a palavra (pensamento, propósito e
vontade revelados) de Deus.
Deus conhecia o
coração de Balaão, sabia que era um "marqueteiro" da fé, que trocaria
(ou adaptaria) a verdade, a palavra de Deus, por um discurso que lhe trouxesse
mais reconhecimento, ganho ou lucro.
Aparentemente, de
acordo com a narrativa, Deus intervém, e, de alguma maneira, muda a rotina do
religioso "poderoso" (Números 22.6), para falar diretamente ao tal profeta,
e através dele. Deus ordena a Balaão que vá, e comunique fielmente o que ouvir,
da parte de Deus. Balaão vai, mas, pensando que fará o que costumava fazer, um
discurso agradável ao interessado, e receber um pagamento compensador.
Por longo tempo,
Deus deixou Balaão enganar multidões que não se importavam em serem enganadas
(que por várias gerações haviam abandonado a Aliança de Salvação feita por Deus
com Noé e suas gerações), ao ponto de que esse profeta se tornasse conhecido
internacionalmente. Porém, agora haveria de ser diferente; por isso, Deus
enviou o seu Anjo, não um anjo qualquer, mas, o Anjo do Senhor, o seu Filho
Eterno, o Redentor dos homens, Jesus Cristo, antes de sua encarnação.
Balaão, não no princípio,
mas depois, viu Jesus Cristo, "com uma espada na mão". Teria sido
somente deste modo que o profeta Balaão, pessoal e intimamente, experimentou a
palavra de Deus, como uma "espada opositora", e jamais como o
"pão” espiritual, pelo qual o homem vive (Mateus 4.4)? Teria Balaão visto
Jesus somente com uma espada na mão, e não o teria conhecido como o “pão vivo
que desceu do céu”, para dar vida ao pecador, reconciliando-o com Deus (João
46.35, 41, 47-51)? Irônico e contraditório, especialmente tratando-se de um
profeta? Triste? Sim, mas infelizmente possível.
Por fim, impedido
por Deus de enganar, naquela ocasião, Balaão falou a verdade, comunicou
fielmente a palavra de Deus, e, o mais importante, comunicou o próprio
Evangelho, referindo-se de modo simbólico à vitoria final de Jesus Cristo sobre
os inimigos de Deus e da humanidade, da verdade, justiça e paz (Números 24.17);
pois Jesus em sua obra redentiva é o propósito e cerne da Profecia (Apocalipse
19.10).
Entretanto, antes do
profeta, foi a sua jumenta que viu o Anjo do Senhor, desviou-se, empacou, e foi
espancada pelo profeta. Porém, “O Senhor fêz a jumenta falar” (Números 22.28),
e falou a verdade, com justiça e sabedoria. O Apóstolo Pedro referiu-se a este
fato, como se segue: “... Balaão, filho de Beor, que amou o prêmio da
injustiça, porém, recebeu castigo da sua transgressão, a saber, um mudo animal
de carga, falando com voz humana, refreou a insensatez do profeta” (2 Pedro
2.15-16).
Deus fez uma jumenta
falar; contudo, e ainda mais extraordinário, Deus fez um religioso, um profeta
corrupto, primeiro ouvir a Deus, e depois falar a verdade diante dos homens; e,
isto sim, é mais difícil do que um jumento falar.
Este relato incomum,
miraculoso e estranho deveria nos impressionar profundamente, pois este é,
ainda que limitadamente, uma capacidade, função e objetivo de um milagre. É
razoável que Deus, não para responder um arrogante desafio humano, mas,
mediante sua soberana vontade e sabedoria, e condescendência, por causa da
dúvida de um humilde pecador, às vezes faça sua palavra acompanhada de algum
milagre. É por isso que na sua palavra escrita (as Sagradas Escrituras)
encontramos registros de alguns milagres.
Entretanto, a
jumenta falar não deveria nos causar mais admiração do que a nossa capacidade
de ignorar a justiça de Deus, e de desprezar a palavra de Deus, mesmo sendo
ativamente religiosos. Sendo do tipo religioso, ou não, precisamos algum dia
pedir Deus, com humildade, sinceridade e intensidade: "Desvenda os meus
olhos, para que eu comtemple as maravilhas da tua lei (palavra)"; e,
"... Ajuda-me em minha falta de fé" (Marcos 9.24).
Precisamos também, sair da sombra dos religiosos
poderosos (já mortos ou ainda vivos), saber que não precisamos de
intermediários entre nós e Deus, exceto de Jesus Cristo que é Deus:
1. Em carne, ou encarnado – para ser acessível a nós, ou
identificar-se conosco, redentivamente;
2. Na História – para ser distinto de qualquer mito
religioso;
3. Crucificado – para quitar nossa dívida perante a
perfeita justiça divina;
4. Ressurreto – para ser reconhecido e distinguido como o
único Salvador;
5. Entronizado nos céus – para subordinar todos os
poderes, e levar à plena realização a sua obra redentiva;
6. Havendo enviado o seu Espírito – para não nos deixar
agora sozinhos;
7. E que voltará – para por fim na Terra a injustiça,
sofrimento e morte.
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