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Saturday 5 July 2014

Família, Igreja e Estado

Embora estas três instituições Família, Igreja e Estado, estejam sob o domínio de Deus, são esferas diferentes da ação e governo de Deus entre os homens. Uma das mais básicas diferenças está na orígem e propósito de cada uma: A família, a mais antiga e fundamental entre a três, foi instituída por Deus ao final de sua obra da Criação. A Igreja é o fruto e resultado da obra da Redenção, iniciada por Deus quando o homem conheceu o mal (Gênesis 3); a obra da Redenção está em processo, ainda não concluída, embora bastante avançada, desde que Jesus Cristo, o prometido Redentor, já se manifestou para tirar o pecado (João 1.29). A obra da Redenção será concluída na segunda vinda de Jesus (Apocalipse 21.22-22.5).

Uma vez que o homem se tornou conhecedor do mal, isto é um pecador, a Família se mostrou incapaz de impedir ou controlar o progresso do mal na sociedade humana; e a Igreja (em sua forma mais remota), embora seja idealmente a comunhão dos pecadores arrependidos e reconciliados com Deus, também se revelou incapaz de conter o crescimento do mal na sociedade humana. Então, após o Dilúvio (o maior juízo de Deus já ocorrido na história da humanidade), Deus mesmo lançou a semente do Estado. Deus havia antes proibido que qualquer pessoa matasse o primeiro homicida, Caim (Gênesis 4.8-16). Porém, após o Dilúvio, ocorrido por causa da multiplicação da maldade e violência humana (Gênesis 6.5,11), Deus ordena ao homem exercer controle sobre a violência, permitindo a pena de morte (Gênesis 9.6).

O Estado existe principalmente para proteger o ser humano da própria violência humana, desde que o homem escolheu conhecer também o mal, tornando-se um pecador ou transgressor da Lei de Deus (1 João 3.4), a Lei eterna e universal (Êxodo 20.1-17), a Lei do Amor (Mateus 22.34-40).

O papel da Família é fazer “crescer e multiplicar” (Gênesis 1.27-28; 9.1) a humanidade, cuidar dos filhos (alimentar proteger), educar ou treinar os filhos para o culto a Deus, para o trabalho, e a construção de uma pacífica, justa e próspera sociedade humana. A missão da Igreja é promover o Evangelho de Jesus Cristo que anuncia o perdão, justificação de pecadores (transgressores da Lei) e a reconciliação com Deus, gratuitamente, somente pela fé em Jesus Cristo (Romanos 5.1); enquanto ela mesma (a Igreja) vive no mundo em conformidade com a Lei de Deus (Mateus 5.14-16). O papel principal do Estado é zelar pelo cumprimento da Lei, no que tange a relação entre os homens, e até trazer a vara ou a espada sobre os transgressores da Lei, que atentam contra a vida humana, contra a integridade e o bem da sociedade humana (1 Pedro 2.11-17).

O Estado deve exercer autoridade sobre todos os seus cidadãos nos limites do seu território. A Igreja exerce governo somente sobre os crentes e seus filhos, em uma determinada congregação, e não possui, nem governa qualquer território. As famílias (as verdadeiras proprietárias de cada porção de terra que forma o território governado por um Estado), idealmente, a partir do casal que vive em amor e mútua cooperação, em harmonia com a fiel Igreja, e no contexto um Estado justo, criam, educam e disciplinam os seus filhos com amor, liberdade e responsabilidade. É assim que famílias e nações properam através de gerações.

Um Estado justo protegerá as famílias e suas propriedades, e até a Igreja na fiel pregação do Evangelho, contra toda forma violência humana. A Igreja não pode usar a estrutura (“maquina”) estatal para tentar alcançar os seus objetivos. Porém, a Igreja e a Família, a primeira como instituição social da Redenção e a segundo como instituição social da Criação não podem deixar de se associar para atingir os seu objetivos soberanamente propostos por Deus. Entretanto, as três instituições podem, cada uma no âmbito de sua autoridade, contribuir decisivamente para atingir o principal objetivo do Estado que é reprimir qualquer tipo de violência, ou promover a justiça no ambito da sociedade, o que nem a Família nem Igreja podem fazer, sem o suporte do Estado.

Tanto a Igreja quanto o Estado são constituídos de famílias; porém, a Igreja e o Estado não podem ignorar o fundamental papel da Família e ignorá-la; nem tão pouco podem eles (Igreja e Estado) tentar suprimir ou dominar, um ao outro, e nem mesmo aceitar o domínio de um sobre o outro. Quando a Igreja ou Estado tentam dominar um ao outro, eles estão usurpando o lugar de Deus.

Estas três instituições devem ser humildes, e, assim, entender que embora sejam instituídas (aprovadas) por Deus, são constituídas de homens e mulheres que conheceram (conhecem) o mal, e estão sujeitas a errar (pecar). O Estado deve ouvir a voz das famílias que o constituem, e da Igreja; a Igreja também deve ouvir a voz do Estado e da Família; afinal, a Igreja também é constituída de pessoas que conheceram ou conhecem o mal; ela não é infalível. As famílias também devem ouvir a voz da Igreja e do Estado; porque, enfim, muitas violências acontecem dentro da própria família.

O Estado não deve ser Cristão (nem tão pouco anti-Cristão); e isto, simplemente porque o Estado não é, como a Igreja é, nem resultado, nem instrumento da obra da Redenção. O Estado existe para promover a justiça na sociedade, e conter toda forma de injustiça. Por isso, o Estado tem que ser justo; e para ser justo o Estado tem que conhecer a Lei de Deus, a Lei eterna e universal; mas, nem por isso, o Estado se torna religioso ou cristão. Como já mencionado, as Escrituras Sagradas (a base da fé Cristã) nos dão uma enorme ajuda na busca do conhecimento da Lei Eterna (Êxodo 20.1-17); entretanto, esta Lei também está gravada na mente de cada ser humano (Romanos 2.14-15) que, em sua maturidade e no devido uso da razão, deveria ser capaz de identificá-la. É devido a esta capacidade que cada indivíduo adulto e o próprio Estado são responsáveis perante Deus, e a Ele, no devido tempo, prestarão contas.

Se o Estado se torna Cristão, ele se torna parte da Igreja; ou ele a dominará, ou será dominado por ela; e, assim, em qualquer hipótese, um corromperia e destruiria o outro. O reconhecimento e a distinção institucional entre Estado, Igreja e família precisam ser observados; entretanto, a distinção não significa separação ou inimizade. A sociedade humana precisa destas três instituições.

Quando a Igreja se estabelece e cresce, fiel à Palavra de Deus, ela se torna uma grande ajudadora das famílias na educação e disciplina dos filhos, e, consequentemente, também ajudadora do Estado, em seu dever de defender (preventivamente) a vida humana de toda forma de violência.

É função da Igreja também instruir e encorajar os crentes a honrar e orar pelas autoridades estatais, no cumprimento do seu dever fundamental de proteger a vida (1 Timóteo 2.1-2).

A maior ajuda ou benefício que a Igreja pode trazer à sociedade é a pregação do puro Evangelho, que não engana pecadores, trazendo-os à igreja sem conversão; mas, pelo poder do Espirito Santo, que transforma o mais cruel pecador no mais dócil e humilde servo de Deus.

Há quem queira uma sociedade sem Estado; estes podeml ser identificados como “anarquistas”. Entretanto, hoje parece predominar a preferência por um Estado forte, se não absoluto, mediante a supressão da Igreja, e agora, mais recentemente, pela supressão da família também.

Neste perigoso contexto, alguns cristãos podem pensar que a solução seria um Estado Cristão, e até usam a antiga teocracia de Israel como o seu principal fundamento. Entretanto, o completo fracasso da teocracia de Israel deveria ser suficiente para convencer todo cristão de que a fusão Igreja e Estado é uma ilusão com gravíssimas consequências.

Através da forma de Igreja-Estado uma vez estabelecida no antigo Israel, devemos aprender a lição de que governo de Deus não depende de um “trono visível”, como pensaram os israelitas ao fim do período dos Juízes (1 Samuel 8.1-7); porém, é a partir dos corações dos homens que o reino de Deus se estabelece (Lucas 17.20-21); isto é, no coração daqueles que reconhecem a soberania de Deus como o Criador e Redentor.

Além desta perspectiva das Escrituras Sagradas apresentada, a História tem demonstrado que a anarquia não funciona, e o “casamento” Igreja e Estado é autodestrutivo; porém, um Estado “todo-poderoso” é um grande desastre para uma sociedade ou nação. Entretanto, a coexistência das três instituições (Família, Igreja e Estado) igualmente respeitadas, preservadas e operando cada uma a sua própria esfera, podem contribuir para uma sociedade equilibrada, pacífica e próspera, uma nação forte.

O Estado tem algumas ferramentas que a Família e a Igreja têem para controlar a injustiça; entretanto, nem com suas próprias ferramentas, o Estado jamais conseguirá erradicar a violência. Contudo, um Estado justo pode, de fato, conter o crescimento da violência. A erradicação da violência somente acontecerá, como já foi mencionado, quando a obra da Redenção estiver concluída, após a segunda vinda de Jesus Cristo, quando o seu reino eterno será universalmente reconhecido (Filipenses 2.5-11).

A paz e prosperidade de uma cidade, provícia ou nação dependem, não de que tenham hoje qualquer tipo de “partido cristão” no poder, ou um prefeito, governador ou presidente cristão, mas de que Jesus Cristo reine nos corações de seus cidadãos. Por isso, enquanto aguardamos a gloriosa volta de Jesus Cristo, preguemos fielmente o seu Evangelho, amemos preservemos a família conforme instituída por Deus desde a Criação, e honremos o Estado na escolha homens que têm demonstrado respeito à Lei, para o exercício da autoridade civil.