No artigo anterior,
procuramos demonstrar que a Igreja é uma eterno propósito de Deus,
inseparável sua obra Redentiva. Somos
salvos por Deus para imediatamente entrar ou pertencer à Igreja de Deus na
Terra.
A Igreja é a
comunhão dos filhos de Deus no mundo. Ela tanto recebe quanto busca e alcança
os “filhos de Deus” entre os os “filhos dos homens”, isto é, dentre as nações.
Ela os alcança através da pregação do Evangelho, e os nutre e educa mediante o
regular ensino da Palavra, levando-os ao conhecimento, confiança e obediência
ao completo desígnio de Deus (Atos 20.27), revelado nas Escrituras. Portanto,
até que cada crente seja intoruzido na
Igreja no Céu, ele(a) deve permanecer
membro da Igreja de Deus na Terra.
Porém, é importante
que se reconheça que ninguém permanece membro da Igreja, somente pelo fato de
um dia haver sido batizado. O ingresso na Igreja pelo Batismo é confirmado pela
participação na mesa da comunhão, a Santa Ceia.
Há, entretanto, membros da Igreja que iniciam um processo de
auto-exclusão, e, por não atenderem as admoestações da Igreja, são por fim são
excluídos.
Entretanto, também
devemos reconhecer que não somente membros individualmente ou famílias se
extraviam da Igreja, mas igrejas também se extraviam da Igreja, isto é da Fiel
Igreja de Jesus Cristo.
Por que “fiel” Igreja?
É por isso que
precisamos enfatizar “que cada crente em Jesus Cristo deve ser membro de uma
fiel igreja de cristã”; pois a Igreja na Terra é constituída de igrejas, e
igrejas podem, infelizmente, tornarem-se infiéis.
Isto é facilmente
demonstrado na História da Redenção reportada na Bíblia. O início da Obra da
Redenção coincide exatamente com o estabelecimento da Igreja. Assim, como
imediatamente após a Queda, Deus se manifestou redentivamente ao homem e a
mulher, também imediatamente Deus estabeleceu a Igreja como congregação dos
salvos ou redimidos do pecado e da morte, por meio de Jesus Cristo. O
sacrifício de Jesus Cristo, em lugar dos pecadores, ficou imediatamente
tipificado no animal que foi morto para prover veste para o homem e a mulher
(Gênesis 3.21); Abel também, como um fiel sacerdote, ofereceu a Deus um culto
agradavel com as primícias do seu rebanho, igualmente tipo do sacrifício de
Jesus Cristo (Gênesis 4.1-4). Além do sacrifício simbólico, a Igreja em seu
mais primitivo estado tinha também a mensagem central, o Evangelho a ser
pregado (aos filhos), a promessa do vitorioso Redentor (Gênesis 3.15). Embora
expulsa do Paraíso, vivendo em uma Terra amaldiçoada, a primeira família da
humanidade foi também a primeira família da Igreja.
Foi também nesse primitivo
contexto que houve o primeiro desvio da Igreja, com Caim que, como em suas
próprias palavras, tornou-se um “fugitivo, um errante pela terra” (Gênesis 4.12);
assim também são todos os homens e mulheres que se separam da Igreja.
A humanidade se multiplicou,
cresceu a descendência física e espiritual de Caim, e a descendência física e
espiritual de Adão, Sete e Enos (Gênesis 4.17-32). Entretanto, próximo aos dias
de Noé, a Igreja dos “filhos de Deus” era aparentemente menor que o restante da
humanidade, e os “filhos de Deus” começaram a se casar com as “filhas dos
homens”. A Igreja se corrompeu dramaticamente; de modo que, aos dias de Nóe, a
fiel Igreja estava reduzida a uma única família, a de Noé (Gênesis 5.32-6.10).
Noé pregou (2 Pedro
2.5), certamente chamando os homens ao arrependimento, mas não viu sequer uma
conversão, somente ele e sua família foram preservados da total destruição causada
pelo Dilúvio. Com o que restou da Igreja pré-diluviana, Deus recomeçou a obra
da Redenção e a Igreja na Terra, abençoando e ordenando a geração de Noé:
“multiplicai-vos e enchei a terra” (Gênesis 9.1).
Aparentemente, Babel
é a orígem e símbolo de toda religião humana, em oposição à obra da Redenção
que Deus realiza e a Igreja que é o seu resultado na Terra. Babel não é a
primeira cidade mencionada na Bíblia (Gênesis 4.17), é uma entre algumas das
primeiras cidades pós-diluvianas (Gênesis 10.1-12), mas parece ser a primeira
cidade que almejou ser um centro político-religioso do mundo (Gênesis 11.1-4).
Babel é a mais primitiva forma do nome Babilônia, o grande símbolo bíblico dos
poderes unidos da política e religião corrompidos (Apocalipse 17.1-5).
Toda falsa religião
é uma oposição à obra da Redenção e à fiel Igreja de Deus; esta, embora
presente nas cidades, enquanto fiel, nunca está associada ou vinculada aos
poderes e propósito das cidades dos homens. Porém, a Igreja sofre sedução da parte da cidade, e a
cidade busca o apoio da religião para levar adiante o seu projeto
antropocêntrico. A “torre cujo tope chegue até aos céus” (Gênesis 11.4)
simboliza bem esta associação entre as cidades dos homens e a igreja apóstata
ou falsa religião. Na cidade, a fiel Igreja exerce sua função profética, cujo
foco é o testemunho de Jesus Cristo (Apocalipse 19.10), enquanto a igreja
apóstata ou falsa religião encobre os desígnios de Deus e ilude os homens.
A Historia da
Redenção é uma história de resgate não só de indivíduos e famílias através da
pregação do Evangelho, mas também de resgate, vivivificação e reforma da Igreja,
através do fiel ensino de toda a Escritura. O que temos considerado sobre a História da
Redenção no período que antecede o estabelecimento da Igreja (Congregação) de
Israel, vai se verificar também na História da Igreja-Nação de Israel, uma
história marcada pela contínua luta contra a apostasia. A História da Igreja da
Nova Aliança também não é diferente; como se pode ver, desde as Cartas Paulinas
e Gerais, antes da virada do primeiro século, a Igreja já lutava contra a
infidelidade, apostasia e falsa religião, como até hoje.
Assim como o homem,
pela ordem natural, determinada por seu estado de rebeldia e separação de Deus,
corrompe toda boa intenção, idéia e instituição; ele também corrompe parcialmente
a Igreja na Terra; por isso, igrejas se tornam infiéis. Na verdade, chega a ser
surpreendente quando uma igreja (ou crentes individualmente) se mantém fiel por
um longo tempo, um especial motivo de gratidão a Deus.
Apostasia é um
perigo real e constante, tanto para crentes individualmente quanto para
congregações inteiras. Infelizmente, nós crentes nos tornamos muito
presunçosos, parece que não existe qualquer perigo, vivemos como se não
houvesse qualquer risco de apostasia. De fato, em todo momento da História da
Redenção há tanto motivo para alegria quanto para lamento, alegria pela porção
da Igreja que permanece fiel, por reformas e avivamentos na Igreja, e lamento
pela apostasia que também devasta parte da Igreja na Terra.
Quando a igreja ou crentes
individualmente ignoram o perigo da apostasia (infidelidade), perigo para o
qual as Escrituras Sagradas intensivamente nos advertem; ou quando permanecemos
impassíveis ou indiferentes aos indícios de apostasia, contribuímos com ela,
com o progresso da apostasia, o avanço da falsa religião, e a devastação da
Igreja.
O que caracteriza uma igreja infiel?
O livro de
Apocalipse, o último livro da Bíblia (provavelmente também quanto a data de sua
composição, não posterior ao ano 96 dC), contém sete pequenas cartas, a sete
diferentes igrejas; estas cartas constituem uma solene exortação contra a
infidelidade e encorajamento à perseverança na fé (Apocalipse 2-3), exortação de
permanente significado e importância para a Igreja, até à volta do Senhor Jesus
Cristo.
Uma igreja pode já estar andando no caminho da
infidelidade e apostasia enquanto ainda preserva excelentes qualidades, como por exemplo as seguintes igrejas,
original e nominalmente endereçadas pelo livro de Apocalipse:
§ A igreja em Éfeso que era ativa no labor, disciplina,
doutrina e tribulação (2.2-3), porém havia perdido o primeiro amor (2.4). Uma
boa e real ilustração para a situação da Igreja de Éfeso é a diferença entre
Marta e Maria quando receberam Jesus Cristo em sua casa (Lucas 10.38-42). Marta,
ao hospedar Jesus, ficou “ocupada em muitos serviços”; Maria ficou “ficou
assentada aos pés de Jesus a ouvir-lhe os ensinamentos”. Com a chegada de Jesus
em sua casa, para Maria “o mundo parou”, nada mais importava; ela estava
encantada com a presença de Jesus, se deliciava na comunhão com Ele, e queria
somente ouvir os seus ensinamentos; daquele que, mais que a maior revelação, é
a própria manifestação de Deus. Era provavelmente isto o que a igreja em Éfeso
havia perdido, o ardente desejo conhecer a Deus, mais e mais, ouvindo Deus
(Oséias 6.3).
§ A igreja em Pérgamo mantinha o testemunho público de
Jesus Cristo em um lugar extemamente hostil, e fielmente enfretou mortal
perseguição (2.13), mas passou a tolerar falsos ensinos e imoralidade (2.14-15).
Enquanto era ainda ativa na Evangelização, a igreja em Pérgamo também já
começava a se extraviar no caminho da infidelidade.
§ Em Tiatira, a igreja era muito ativa e operosa,
manifestava amor e fé (2.19), porém tolerava uma falsa profetiza, e,
consequentemente, imoralidade e idolatria (2.20-23). Como é impossível separar
o amor do ouvir a Palavra de Deus (Salmos 119.167; João 5.38-42; 14.23-26;
15.7-13); a igreja em Tiatira ainda tinha ouvidos para a Palavra de Deus (pois
nela ainda havia amor e fé); entretanto, também já dava ouvidos a falsos
profetas e mestres, e estava dividida entre os escutavam a Palavra de Deus e os
que queriam ouvir “as coisas profundas de Satanás” (2.23-25); isto é
infidelidade e apostasia.
Entretanto, tristemente, o que era ruim poderia ser
ainda pior; havia a real possibilidade da infidelidade e apostasia crescerem,
de forma devastadora, como é possível constatar em outras duas cartas:
§ A igreja em Sardes, estava morta, a começar com aquele
que ocupava o lugar de ministro da Palavra, o anjo da igreja (3.1), que já não
pregava mais a Palavra de Cristo Jesus, “as palavras de vida eterna (João
6.68). Como conseqüência, naquela igreja, somente “umas poucas pessoas” estavam
lavadas no sangue do Cordeiro (3.4; 7.14). Precisamos considerar isto
seriamente, antes do fim do primeiro século, a igreja em Sardes já contava com
uma maioria morta espiritualmente, que não conhecia a Salvação.
§ Antes do final do primeiro século, a igreja em
Laodicéia era insuportavelmente arrogante e completamente enganada (3.15-17).
Estas características parecem descrever, com muita propriedade, também grande
parte do cristianismo contemporâneo.
Não podemos ignorar,
permanecer impassíveis e omissos diante do real perigo de infidelidade ou
apostasia na Igreja; pois, andar junto com uma igreja infiel é tomar o mais
fácil enganoso caminho para o inferno.
Como evitar que uma igreja se torne infiel?
Embora a
infidelidade seja um perigo real e comum, é importante enfatizar que a Igreja é
exortada a permanecer fiel, e efetivamente pode permancer fiel. Jesus reina
reina no Céu, e do Céu, sobre toda a Criação. Entretanto, logo que ascendeu aos
Céus, Ele também enviou o Espírito Santo para conduzir a Igreja a toda Verdade
(João 15.26-27; 16.13), e também deu-nos as Escrituras Sagradas completas. É
assim, que embora entronizado no Céu, Jesus também se faz presente em sua
Igreja na Terra (Apocalipse 1.10-20).
É através do fiel ministério
da Palavra, seguido da fiel admininstração dos sacramentos (selos e
sinais) da Palavra (batismo e santa ceia), e fiel disciplina
(funcionamento) da Igreja que Jesus Cristo governa a sua Igreja na Terra e a
mantém fiel. E é o ministério da Palavra que regula a administração dos
sacramentos e funcionamento ou vida da Igreja.
Todas as sete cartas
têm uma forma comum de introdução: “ao anjo da igreja... escreve”, e,
igualmente, uma conclusão comum: “quem tem ouvidos, ouça o que o Espirito diz
às igrejas”. É precisamente o que “foi escrito”, exatamente o mesmo que “o Espirito
diz às igrejas” (pois a Palavra e o Espírito não se contradizem), que impede
uma igreja tornar-se infiel. É a Palavra de Deus escrita, fielmente pregada e
ouvida, que preservam a fidelidade da Igreja. Os ministros da Palavra devem
conhecer a Escritura Sagrada, devem se alimentar dela regularmente, devem
amá-la e honrá-la. A igreja deve desejar a Palavra de Deus mais do que o ouro,
ou o mel (Salmos 19.10), e repudiar qualquer adulteração da Palavra (2
Coríntios 2.14-17; 4.1-2). Ambos, ministros da Palavra e igrejas, precisam
reconhecer a centralidade de Jesus Cristo na Palavra de Deus; pois nÊle, a
glória de Deus se revela de forma incomparável (2 Coríntios 4.3-6).
Igrejas podem permanecer fiés, como as que estavam em
Esmirna e Filadelfia, estas:
§ Não receberam do Senhor qualquer reprovação,
§ Tão somente foram exortadas a permacer fiéis, em face
dos sofrimentos que estavam por vir (2.20; 3.10);
§ Ambas foram elogiadas – Esmirna, por ser rica,
certamente em contraste com a sua pobreza material e a pobreza espiritual de
Laodicéia (3.9; 3.17), e Filadéfia por haver guardado a Palavra (3.10).
§ Igualmente receberam a promessa da “coroa da vida” (2.10-11;
3.11-13).
Final e
curiosamente, é nas cartas às igreja em Esmirna
e Filadelfia somente que são mencionadas as “sinagogas de Satanás” (2.9;
3.9); certamente porque aquelas, dentre as sete igrejas, eram o mais evidente
contraste com as congregações judaicas que haviam rejeitado a Jesus, o Cristo.
Por quanto tempo
pode uma igreja permanecer fiel? Pelo tempo em os ministros da Palavra se
atenham à Palavra Escrita e somente preguem esta Palavra, e a igreja somente
tenha ouvidos para ouvir a Palavra de Deus, o que o Espirito tem a dizer para a
igreja. A Igreja permanece fiel enquanto reconhece a autoridade única e
centralidade da Palavra de Deus, enquanto deseja ardentemente ouvir a Palavra
de Deus.
Como restaurar uma igreja que se tornou infiel?
Não há dúvida de que
é possível restaurar uma igreja que se tornou infiel. Se assim não fosse as
igrejas em Sardes e Laodicéia não teriam
recebido as cartas que receberam. Porém é necessário que haja verdadeiro
arrependimento (3.3, 19), não basta uma aparência ou rito de arrependimento; e
a grande evidência do arrependimento que vivifica a igreja é o restabelecimento
do fiel ministério da Palavra que prega somente o que “está escrito”, para uma
igreja que somente se interessa em ouvir o que o “Espírito diz às igrejas”.
Cada crente tem o
dever de ser membro de uma fiel igreja de Jesus Cristo, não pode, como Caim, se
separar dela. Cada crente deve amar a Igreja de Cristo, e expressar isto
vivendo na plena comunhão de uma fiel igreja de Cristo. Cada crente tem o dever
de seguir o exemplo dos membros da “sinagoga dos judeus” na cidade de Beréia,
os quais, em sua maioria, ouvindo a Paulo e Silas, “receberam a palavra com
toda avidez, examinando as Escrituras todos os dias”, para conferir com o que
ouviam (Atos 17.10-11).