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Saturday 11 December 2021

Bíblia - Atualização ou Interpretação?

O grande desafio à Igreja hoje não é preservar ou recuperar a originalidade das Escrituras Sagradas. O grande desafio é interpretá-la corretamente, compreendê-la, para não fazer proposições falaciosas, já provadas pelas próprias Escrituras como ineficazes.

No Antigo Testamento, isto é, da perspectiva autor e leitor (ouvinte), a Igreja está restrita à descendência física de Israel (Jacó). Durante o Cativeiro Egípcio, vivendo à sombra de uma poderosa monarquia, a Igreja de Israel cresceu e ultrapassou a condição de uma única família, tornando-se uma grande nação. Durante séculos, constituida de doze tribos, Israel sobreviveu como uma nação de “governo patriarcal e tribal”.

A partir de Moisés e Josué, esta Igreja de Israel é organizada como uma nação de Governo (Estado) Civil e Religioso, e se estabelece em um território. A Lei de Moisés é a Lei deste Estado ou Governo Civil e Religioso.

A Lei de Moisés é um Regulamento/Estatuto Moral-Penal-Cerimonial (Civil-Penal-Religioso). Este regulamento foi “adotado” por Israel em uma Aliança com Deus, tendo Moisés como o mediador (intermediário) entre Deus e a nação de Israel. Note-se que este estatuto somente foi dado a Israel varios séculos depois do chamado da descendência de Abraão-Isaque-Israel para ser uma benção para todas as nações (Gênesis 12.1-3). A descendência de Abraão-Isaque-Israel foi chamada, não por méritos morais, mas pela graça de Deus que não se limita a Israel. Abraão e sua “descendência espiritual”, seja ela israelita ou não, são justificados somente pela fé (Gênesis 15.1-6; Romanos 4.1-5; Gálatas 3.6-9).

Abraão e sua descendência física não possuía um pedigree moral superior ao de seus contemporâneos. E isto fica patente nas páginas do Antigo Testamento. Desde Abraão, os pecados desta geração, em certo sentido, eram impedimentos para que ela fosse luz e bênção para as nações. As trapaças de Jacó parecem inocentes, comparadas à  maldade e violência de seus filhos.

É neste contexto provido pelo Pentateuco (os cinco livros da Lei de Moisés) que a Lei foi estabelecida em Israel. O que parece ser o último recurso para santificar Israel para a grande missão a que foi chamada por Deus, ficará inequivocamente provado ser completo fracasso. A Lei não santificou Israel, ao contrário, “avultou a ofensa” e “abundou o pecado” (Romanos 5.20-21)

A Lei de Moisés, especialmente em seus aspectos Civil e Penal tinha semelhanças e diferenças com outros Códigos Legais da antiguidade, como o conhecido Código de Hamurabe. Porém, é geralmente admitido que a Lei Civil e Penal de Moisés era melhor, comparada às de alguns outros povos.

Contudo, a Lei de Moisés é limitada, e tornou-se obsoleta, não somente em seu aspecto Cerimonial (Religioso), mas também em seus aspectos Civil e Penal. Por exemplo, no aspecto Civil ela admite e regulamenta a escravatura. Além disso, há mais de dois mil anos, Jesus demonstrou a caducidade da Lei Penal de Moisés no dia em que lhe apresentaram uma mulher surpreendida em adultério (João 8.1-11).

Entretanto, o Antigo Testamento não é somente Lei, é também História, e História também em Salmos e Profecias. A História de Israel é testemunho do fracasso de toda e qualquer regulamentação moral, penal e religiosa. O Antigo Testamento é o registro histórico do fracasso do homem, tanto no Governo Civil quanto no Governo Religioso, do fracasso do Estado e da Religião. Milênios se passaram, o conhecimento multiplicou-se extraordinariamente; e o Estado e a Religião continuam fracassando, e frustrando a humanidade.

Felizmente, o Antigo Testamento não é somente história do fracasso do homem. A História de Israel aponta para o futuro, e firma uma grande esperança, o Reino de Deus na vinda do Messias/Cristo.

No Novo Testamento a Igreja nasce separada do falido Estado/Governo Civil e Religioso de Israel. Diferentemente de Israel, a Igreja da Nova Aliança:

§  Não tem qualquer relação formal com o Governo Civil e Religioso de Israel (Judeu)

§  Não recebeu um Regulamento Moral-Penal-Cerimonial (escrito)

A Igreja recebeu as Escrituras Sagradas, que contém o Regulamento Moral-Penal-Cerimonial de Israel. Porém, as Escrituras Sagradas não são essencialmente um regulamento Moral-Penal-Cerimonial. Elas estão muito acima disto. Elas são a História e o Conhecimento da Redenção, escrita por profetas escolhidos por Deus, e inspirados pelo Espírito Santo (2 Timóteo 3.14-17; 2 Pedro 1.16-21).

A Igreja da Nova Aliança tem a Lei de Deus escrita/gravada na mente e coração dos homens e mulheres regenerados (Hebreus 8.6-13).

A Igreja da Nova Aliança não tem um território, como Abraão, seu pai na fé, ela tem uma promessa: Novos Céus e Nova Terra. Enquanto espera, ela se reúne em diversas congregações entre as nações.

A Igreja da Nova Aliança nasceu separada do Reino dos Judeus e separada do Império Romano, e assim deve permanecer em relação a qualquer Governo humano.

A Igreja da Nova Aliança foi enviada às nações para anunciar o Evangelho do Reino (de Deus/dos Céus). Em qualquer nação, os que ouvindo o Evangelho, se arrependem de seus pecados e creem em Jesus como o Salvador e Senhor, tornam-se membros da Igreja e cidadãos do Reino de Deus. É na Igreja da Nova Aliança que a promessa de Deus em fazer da descendência de Abraão uma benção para todas as famílias e nações têm o seu pleno cumprimento.

A Igreja da Nova Aliança é o Reino de Deus, e sua missão é conquistar as nações, por meio da pregação do Evangelho, expandindo e construindo o Reino de Deus.

O Reino de Deus não declara guerra governos das nações, e nem se alia a eles. A Igreja da Nova Aliança não pode perder o foco nos interesses do Reino de Deus, desviando-o para o Governo do Homem. Desde o começo da História, o Governo do Homem constrói Babel, Babilônias, e assim será até o final, até a última e Grande Babilônia. Porém, a Igreja está envolvida, de corpo e alma, na expansão e construção do Reino de Deus.

O Reino de Deus (dos Céus), inaugurado na vinda de Cristo, co-existirá com os reinos das nações, até a volta de Cristo. O Reino dos Céus não competirá, nem sabotará os reinos das nações. Entretanto, o Reino de Deus será continuamente uma antítese aos reinos deste mundo (dos homens); e, somente assim será o “sal da terra” e “luz do mundo” (Mateus 5.14-16).

A Igreja da Nova Aliança/Igreja de Cristo não pode se iludir com a ideia de uma “monarquia cristã” ou de uma “democracia cristã”. A Igreja tem, nas Escrituras Sagradas, o testemunho escrito da falência da Igreja provisória da Antiga Aliança.

O Reino de Deus não tem aparência visível. Isto é, ele não tem aparência visível de Reino. Ele é a Igreja da Nova Aliança, e ela:

§  não tem território (posses materiais, poder financeiro)

§  seu Cabeça/Governante é Jesus Cristo (que agora governa do Céu),

§  Seu poder de persuasão, convencimento e congregação é o Espírito Santo (que nela habita invisivelmente),

§  sua Lei é a Lei do Amor (Mateus 22.34-40; Romanos 13.8-10)

É assim que a Igreja tem conquistado o mundo, e transformado indivíduos, famílias e nações. E isto acontece, “não por força ou violência, mas pelo Espírito” (Zacarias 4.6), não pela espada, exceto a espada do Espírito, a Palavra de Deus, o Evangelho (Hebreus 4.12). A Igreja avança, não pelo poder da “lei do pecado e da morte”, exceto pela “lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus (Romanos 8.1-11).

Não é função da Igreja da Nova Aliança propor ou sugerir às nações que adotem a Lei de Moisés, no todo ou em partes, mas simplesmente anunciar o Evangelho da Graça.

Voltando à pergunta inicial, a Bíblia precisa ser atualizada ou devidamente interpretada? A palavra atualização é ambígua, pode significar correção, e até censura. Graças a Deus, o Texto Original está muito bem preservado. Porém, o que parece estar faltando em muitos púlpitos e escolas é a fiel e inteligente interpretação das Escrituras Sagradas, sob a iluminação do Espírito Santo.